sábado, 19 de junho de 2010

Não existe almoço grátis

O Brasil é famoso pelo seu jeitinho de ser: povo alegre, hospitaleiro e com um quê de malandragem para tirar vantagem das situações, traduzida pela famosa Lei de Gérson.

Faz parte do costume brasileiro uma espécie de modus operandi onde o oportunismo, amparado pelo individualismo, dirige a ação dentro da conveniência pessoal em detrimento do interesse do outro ou da coletividade.

Quer seja no âmbito governamental, empresarial, profissional ou do senso comum, o brasileiro tende a não cumprir com as suas obrigações e exercer o seu direito, mas tão somente transferir o “macaquinho problemático” para outrem fazê-lo.

O brasileiro é assim, fala muito e faz pouco e se diz indignado com a corrupção do Brasil e com a falta de ética dos seus governantes, no entanto, em suas ações particulares age dentro da mesma lógica daqueles que critica na primeira oportunidade que tiver, tais como: pagar ou aceitar propina, ultrapassar pelo acostamento, fazer um puxadinho do seu estabelecimento comercial na área pública, invadir terras e destruir propriedades que julgam “improdutivas” dentre outros.

Apesar de saber que suas ações são moralmente erradas, a pessoa perdoa a si mesma porque acredita que sua transgressão não será notada e principalmente não será punida, além do que para ela o que importa é ter se dado bem.

Infelizmente, de certa forma, todos nós acabamos compactuando com esse jeito brasileiro de ser e alimentando o ciclo vicioso: reproduzindo-o, transmitindo por meio dos exemplos para os nossos descendentes ou nos calando diante das ações infratoras da lei.

As pessoas estão cada vez menos interessadas em cumprir com as suas obrigações de cidadão, pois elas sabem que poderão obter tudo aquilo de que elas precisam por meio do jeitinho. Isso é um problema grave porque desestimula o esforço pessoal produtivo e a observância das leis.

Enquanto a fonte não secar, elas não terão interesse de se mobilizar, de pensar no futuro já que o que realmente importa é somente a vantagem usufruída aqui e agora, mesmo que isso signifique prejudicar o outro.

Sempre que as pessoas agirem exclusivamente segundo as suas conveniências, exaltando o individual em detrimento do coletivo, estarão contribuindo para o prejuízo social. Quando a pessoa não faz a sua parte, caberá a outrem arcar com a conta. Enquanto uns ficam na mamata os outros ficam sobrecarregados na sua sustentação

Assim, urge a necessidade de que o pensamento coletivo seja parte dos princípios do povo brasileiro e que os valores sociais busquem a moralidade e a consciência em prol do benefício coletivo. O convívio social tem o seu preço e a cidadania tem de ser paga. Se se cada um não fizer a sua parte, sempre terá alguém que pagará a conta a preços exorbitantes pelo outro, pois não existe almoço grátis!

É difícil mudar os costumes, porém se faz necessário mudar toda essa mentalidade do jeitinho brasileiro, a fim de criar as bases da obrigação e do dever, a essência do bem e do mal, as bases da consciência moral, e as razões para a justiça e a harmonia das condutas socialmente aceitas. Caso contrário, nós prosseguiremos no caminho da perpetuação de uma sociedade corrupta e corruptora, onde todo o povo sairá no prejuízo. Como diz o ditado brasileiro: “Quem conta com a panela alheia, arrisca-se a ficar sem ceia”.

terça-feira, 15 de junho de 2010

A prostituição de terno e tailleur

A prostituição é uma das mais antigas profissões que se tem registro na nossa história. Trata-se do prazer pago, onde uma pessoa (homem ou mulher) “comercializa” o seu próprio corpo em troca de dinheiro ou de algum favorecimento pessoal, sem se envolver emocionalmente.

Os padres da Philokalia foram os primeiros a definirem a prostituição como sendo a desvalorização de si mesmo e do outro, tratando a si e ao outro como objeto de consumo e de prazer

Com o advento do capitalismo, a vida passou a girar em torno do dinheiro, corrompendo os princípios morais e a prostituição sofisticou-se e recebeu novos contornos na sociedade ocidental.

Toda a vez que se quer ou procura diretamente o prazer do dinheiro há uma gravíssima desordem emocional e se coloca em risco a conservação do amor pelo ser. Uma vez que as pessoas procuram acumular dinheiro não para satisfação de suas necessidades básicas de sobrevivência, mas para alimentar a sua vaidade e se auto-afirmar.

Na nossa sociedade, quando se menciona uma prostituta, logo é apresentada uma figura estereotipada, tal como uma mulher com roupas sumárias, ofertando-se à noite numa das esquinas do centro da cidade. Mas se aprofundarmos um pouco a reflexão do que ocorre no mundo profissional onde o valor do indivíduo é mensurado a partir dos bens que ele acumula e exibe, verificaremos que não há muita diferença entre certos profissionais e os confessos vendilhões do prazer.

Atualmente muitos profissionais não são comerciantes do corpo, mas tão somente da sua alma, embora em alguns casos ainda há a retribuição do favorecimento profissional por meio de relações sexuais. Quem nunca ouviu dizer ou disse que a loira gostosa só foi promovida porque “deu” para o chefe?

Entretanto esses profissionais jamais admitirão a venda de suas almas tal qual a prostituta vende o seu corpo, no entanto, por uma carteira recheada de dinheiro ou a segurança de um bom emprego, muitos profissionais são capazes de abrir mão de sua liberdade de expressão e das suas convicções pessoais, permitindo ser manipulados e virarem um brinquedinho na mão daqueles que detêm o poder.

terça-feira, 8 de junho de 2010

No túnel do tempo

Neste ano estarei completando 10 anos de formada. Hoje bateu uma certa nostalgia e resolvi voltar no túnel do tempo. Foi a primeira vez, pelo menos até onde eu tenha conhecimento, que uma aluna foi paraninfo da turma. Lembro-me como se fosse hoje a minha transformação, em pleno palco, de formanda para fada madrinha e o meu discurso emocionado, quebrando todos os paradigmas até então vigentes dos cerimoniais. Foi um momento inesquecível que agora compartilho com vocês, pois recordar é viver!

Discurso

Boa noite! Hoje é um dia muito especial para todos nós aqui presentes e, particularmente, para mim, que estou tendo esta oportunidade ímpar de ser homenageada, como paraninfa, pela primeira turma de formandos de administração do currículo novo - na qual eu me incluo - do Centro Universitário de Brasília – UniCEUB.
Ao elaborar esta oração, resolvi ouvir a voz do coração para poder expressar toda a emoção que estou sentindo e que gostaria que vocês compartilhassem. Neste momento, sinto que nós, formandos, após todo o processo de preparação, estamos aptos para completar nossa metamorfose, passando de universitários a administradores.
Em nossa caminhada acadêmica, surgiram muitos obstáculos que nos exigiram a determinação de um guerreiro, para continuar a defender a nossa ideologia de administradores; a sabedoria dos grandes mestres, para enxergar além das aparências e conhecer a própria essência da vida – o amor, a alegria do palhaço, para achar graça das situações difíceis, e sorrir diante das dificuldades; a paixão dos amantes para encarar o dia a dia de sala de aula, não como um sacrifício, mas como enorme prazer; a perseverança do aprendiz, para continuar a seguir em frente, mesmo que todas as evidências mostrassem o contrário.
Todas essas dificuldades enfrentadas fizeram-nos amadurecer, unir esforços, constituir laços fortes de amizade, aprender mais sobre a vida e formar o cabedal de conhecimentos que ficarão guardados na nossa caixinha da memória, porto seguro de nossas gostosas lembranças.
Mas, tudo isso foi possível graças a Deus, nosso senhor, e ao apoio integral dos pais, dos cônjuges, dos filhos, dos parentes, dos educadores e dos nossos amigos, cuja importância devemos agradecer e conhecer na construção de nossa história.
Agora, estamos com as asas providas para alçar vôos maiores, para conquistar nosso lugar ao sol. É claro que surgem dúvidas, receios e inseguranças em relação ao futuro profissional, que devemos encarar, no entanto, como nova oportunidade que surge. Devemos estar cientes de que não há caminho seguro, só trilhas cheias de ameaças e oportunidades, cabendo a cada um de nós fazer a escolha do prisma por que iremos olhar. Há três coisas que nunca voltam atrás: a flecha lançada, a palavra pronunciada e a oportunidade perdida. Por isso devemos valorizar cada segundo da nossa vida, aproveitando-a intensamente e vendo-a pelo seu lado bom amar as pessoas e fazer o nosso melhor possível para deixar o mundo melhor do que o encontramos. O tempo é demasiado lento para os que esperam, demasiado longo para os aflitos, demasiado curto para os alegres, mas para os que amam o tempo é uma eternidade.
A profissão que abraçamos nos dá todas as condições para colocar tudo isso em prática. O primeiro desafio começa conosco mesmos. Devemos aprender a analisar o nosso verdadeiro eu, definir nossa missão, traçar os objetivos, adotar princípios, administrar conflitos internos e de relacionamentos interpessoais, aceitar a mudança, criar, inovar para alcançarmos o mais cobiçado resultado da vida: a realização pessoal. Vencida essa etapa, estaremos aptos para ser excelentes profissionais, pois assumiremos o papel de agregadores de valores às organizações que escolhermos para pertencer. Nelas, devemos ser os visionários, os condutores das esperanças e os realizadores dos sonhos. E, como sermos tudo isso? É simples, em vez de amar as coisas e usar as pessoas, devemos amar as pessoas e utilizar as coisas. Assim, como o carpinteiro transforma a grossa madeira em lindo móvel com a utilização de ferramentas e técnicas, o administrador deve trabalhar com as pessoas. Trabalhar com suas qualidades, tornando-as valiosas, fazendo com que superem os pontos negativos, concentrem-se na melhoria dos pontos positivos. Ao tratar com sinceridade e perceber os pontos fortes de cada pessoa, será possível colher os melhores frutos dos seres humanos. Assim, o papel do administrador é extremamente importante, pois sua atividade de aflorar a qualidade, torna-o nobre de espírito e capaz de inspirar todos os êxitos humanos.
Agradeço mais uma vez e encerro o discurso, oferecendo a todos vocês o seguinte pensamento: Deus nos concede a cada dia uma página nova no livro do tempo, o que colocamos nela corre por nossa conta. Muito obrigada a todos

segunda-feira, 7 de junho de 2010

No reino da mediocridade

Assim como pragas que se espalham na plantação, a mediocridade se proliferou na sociedade. Todos os dias brotam por todos os lugares uma quantidade enorme de João sem Braços.
Pessoas que não sabem de nada, não vêem nada e não escutam nada para não se comprometerem, pois é muito mais fácil deixar-se passar por ignorante do que firmar um posicionamento e ser questionado sobre sua atuação.
O tempo todo, as pessoas têm necessidade de aparentar aquilo que não são para satisfazer uma expectativa da sociedade pautada na imagem. Transmitir uma imagem positiva é muito mais importante do que expor o que se sente de verdade. Por isso é inconcebível se indispor com o outro, pois não tem retorno o investimento de ser autêntico e agir fora dos padrões comportamentais ditados pela sociedade. Assim sendo a crítica é evitada a qualquer preço!
A vida moderna se transformou num grande palco. Todos estão sempre representando papéis segundo a conveniência do momento. Às vezes atuam como mocinhos, outras vezes como vítimas e assim sucessivamente. No final das contas para as pessoas o que importa é a reação que consegue obter do público. De preferência uma comoção geral, conferindo-lhe aplausos efusivos de toda a platéia ao final daquele espetáculo.
Mas como o costume faz o hábito, de tanto as pessoas representarem, elas acabam se convencendo de sua própria atuação. O personagem se transforma no seu ser real.
As pessoas deixam de tomar as rédias de sua existência e vivem na clandestinidade dos seus papéis. A vida vai perdendo o sentido quando se substitui a riqueza do contato humano tetê-à-tête pelas máscaras do personagem da conveniência, dando espaço para a hipocrisia.
Mesmo que seja benéfico o aprofundamento de um tema, ninguém está disposto tratá-lo nas suas raízes, mas tão somente no que é visível aos olhos de todos. Assim as pessoas alcançam na vida somente a profundidade de um pires, ou seja, tudo fica no nível da superficialidade.

Por meio de suas representações, elas tratam temas complexos e técnicos com a mesma superficialidade de temas comuns. Utilizando o jocoso para transmitir assuntos sérios e o tom sério para tratar de assuntos banais, os valores sociais são invertidos ou mudados com uma grande dose de humor negro.
No apagar das luzes do espetáculo, o problema é saber quem é o que e quando. Em todas as situações, representar é o melhor remédio para a sobrevivência.
Haja “Oscar” para distribuir aos atores e às atrizes de nossa sociedade!

Tudo que o nosso chefe mandar fazer, faremos e senão fizermos, o que nos acontecerá como profissionais?!

Na infância, muitos de nós tivemos a oportunidade de brincar de boca de forno. Tratava-se de uma brincadeira onde se elegia uma pessoa para comandar uma turma de crianças que, em princípio, deveriam atender as suas vontades. Iniciava-se sempre assim:

Comandante – Boca de Forno!

Comandado – Forno!

Comandante – Tudo que eu mandar vocês fazerem?

Comandados – Faremos

Comandante – E se não fizerem?

Comandados – Apanharemos...

Apesar de se repetir a fala, a brincadeira era sempre diferente, dependendo de quem exercia o papel de comando. Às vezes, ela era animada, em outras chatas e em muitas interrompidas por divergências e ou não aceitação do comando.

O ritmo da brincadeira era ditado pela criatividade, pelo senso de humor e principalmente pela influência exercida pelo comandante sobre os comandados para obedecê-lo.

Vemos essa mesma dinâmica nas organizações. Quem está com a batuta na mão que dá o tom do andamento dos trabalhos e os resultados dele advindos.

Dependendo do estilo gerencial e das crenças que possuem, alguns “comandantes” querem impor sua autoridade pela força, outros deixam a coisa correr frouxo com medo de se posicionar para não perder a querência dos seus comandados e têm ainda os que exercem uma natural influência sobre o comportamento de seu subordinado, fazendo com que o seu mando seja cumprido naturalmente, pois há a criação de um vínculo de submissão voluntária.

Quando se impõe a autoridade, há um movimento natural de defesa de território pela parte receptora da ordem. O instinto de sobrevivência aguça-se e a pessoa “ameaçada” fica alerta, pronta para o combate ou a dispersão. Mesmo que não se tenha nenhuma pretensão maldosa oculta por detrás da ordem, a desconfiança reinante faz com que a pessoa encontre fortes indícios de que a fala está maquiada de segundas intenções. Haverá o levantamento de uma verdadeira fortaleza para a proteção do eu e da liberdade e inicia-se a resistência velada ou exposta àquilo que foi ordenado, resultando na vivência de um campo de batalha diário e numa baixa produtividade.

Quando se deixa correr frouxo as coisas e fica em cima do muro, o comandante passa uma imagem de fraqueza. Ninguém o leva a sério, pois ele é o primeiro a não se posicionar e quem gritar mais alto leva a brasa para sua sardinha. A manipulação dos interesses se torna presente no dia a dia do trabalho e aquele que for mais esperto tirará proveito da situação a seu favor, tornando-se o comandante informal. Desenvolve-se o querer bem do chefe banana porque todo mundo gosta de levar vida mansa, mas, em contrapartida, o respeito vai para o ralo, prevalecendo o ritmo do samba do crioulo doido na casa da mãe Joana. A produtividade oscila entre o atendimento das demandas pessoais do comandante informal e da organização.

Quando há a assunção consciente do posto pelo comandante visando superar os desafios e atuando conforme as circunstâncias exigem, definindo-se o caminho a ser percorrido com firmeza, com clareza e compartilhando as informações para o alcance dos objetivos, cria-se um sentimento de unidade em todos os envolvidos. O comandante trafega de forma tão humilde pelos níveis do poder que é totalmente imperceptível quando ele exerce o papel de servo e de comandante. Com isso ele angaria simpatia e neutraliza a resistência, pois todas as pessoas se sentem iguais fazendo parte de uma grande conquista onde se mistura o pessoal e o grupal de forma harmônica. Esse sentimento de valorização da pessoa humana que o comandante faz brotar no coração dos comandados lhe traz respeito, admiração e lealdade. Sob o seu comando, os comandados se tornam verdadeiros paus para toda a obra, resultando num aproveitamento total das potencialidades humanas e produtividade acima do projetado no planejamento.

Assim, na estrutura organizacional, o verdadeiro comandante, também chamado de líder, que fará diferença. Mas encontrá-lo é uma tarefa árdua e muitas vezes desanimadora para o departamento de Recursos Humanos. Às vezes é mais fácil encontrar uma agulha no palheiro do que um verdadeiro líder.

Poucos serão os eleitos para experimentar os privilégios de um bom comando que torne o trabalho numa grande fonte de prazer. Se você for um desses privilegiados, aproveite, pois a maioria de nós terá que se contentar com os mandos e desmandos de comandantes que não passam de chefes.

Sem a regulamentação da função comissionada o serviço público vai para o brejo!

Em princípio as funções comissionadas dos órgãos públicos deveriam ser concedidas às pessoas como uma forma de reconhecimento pelo bom desenvolvimento do trabalho e de estímulo em prol de melhores resultados no desempenho institucional. Entretanto, como na maioria dos órgãos públicos não há uma política clara sobre a sua concessão, a função comissionada tornou-se uma moeda de troca de favores entre os detentores do poder. Apesar de se ter uma norma para combater o nepotismo, a realidade mostra que ela, assim como outras leis no Brasil, não é cumprida.
É comum a cada nova gestão haver o ingresso dos “amigos do rei”, cujo principal critério de seleção utilizado é o princípio da confiança. Assim de periquitos a papagaios acabam ingressando no serviço público sem preparo profissional e sem nenhum comprometimento para com o órgão, mas tão somente para com o seu “rei” e para consigo mesmo (Lei de Gérson), trazendo uma série de conseqüências maléficas para o dia a dia da organização. Como para toda regra, há exceções, é claro que existem alguns profissionais qualificados e competentes que são convidados para exercer funções comissionadas pelo rei.
Como as funções comissionadas são, na sua grande maioria, de posições estratégicas que ditam os caminhos (visão de futuro) a serem tomados para o cumprimento da missão institucional (o porquê da existência do órgão), o serviço público muda de feição a cada troca de gestão, pois as novas chefias querem deixar sua marca registrada, descontinuando o processo de trabalho até então reinante, para aplicar os seus próprios métodos de trabalho mesmo que isso signifique reinventar a roda e desperdiçar o dinheiro público investido nos projetos que foram interrompidos.
Além da ocorrência de descontinuidade administrativa, existe também o fato dos “amigos do rei” não permitirem que o gestor que iniciou o trabalho receba os créditos pelo seu feito, como se nada houvesse sido realizado anteriormente. Isso se deve ao fato de que o novo chefe – num pensamento altamente egoísta, não querer rechear a empadinha do outro, mas tão somente a sua.
O lado mais perverso de tudo isso é que quando o trabalho começa a engrenar com a superação dos mandos e desmandos dos novos “amigos do rei”, há a mudança de gestão e se reinicia todo o processo num ciclo vicioso sem fim.
A falta de comprometimento e a falta de conhecimentos técnicos sobre o desenvolvimento do trabalho e sobre o funcionamento do órgão pelos “amigos do rei” fazem com que as decisões sejam tomadas mais para agradar o soberano do que em prol do bom desempenho do trabalho.
Talvez as maiores competências que os “amigos do rei” possuam e desenvolvam na condução do trabalho são: saber massagear o ego e exercer o papel de bobo da corte para atendimento dos caprichos pessoais do rei.
Nesse processo de “puxada de saco”, os “amigos do rei” são capazes de se submeterem a infinitas humilhações e aceitarem desafios fora da sua alçada de competência. Às vezes sua atuação se limita a assinar documentos cujos assuntos tratados são por eles completamente desconhecidos, inclusive permitindo que ele seja utilizado como “laranja” de processos escusos.
Em outras vezes ele tenta aprender os serviços com os seus subordinados ou por meio da participação em cursos de capacitação, tirando a oportunidade do servidor de se capacitar e aplicar na prática o aprendizado, mesmo após a troca de gestão.
Mas o desempenho dos “amigos do rei” obviamente não passa da mediocridade, uma vez que o processo de aprendizado não ocorre do dia para noite, mas sim ao longo do tempo com o acúmulo do conhecimento e das experiências profissionais. Entende-se como desempenho a relação entre investimento x retorno que se obtém deste investimento. Assim sendo o resultado do desempenho de um profissional pode ser dado pela sua capacidade de fazer e de sua atitude de querer fazer um trabalho de excelência.
Como navegam ao sabor dos bons ventos soprados pelo rei, os “amigos do rei” desconhecem o porto no qual irão aportar deixando o trabalho à deriva. Não obstante utilizarem tempo, recursos e tecnologia da informação de última geração os resultados de suas ações são estéreis que só servem para dilapidar os cofres públicos.
Por mais estéreis e maléficas que as ações sejam para o bom andamento do serviço, os “amigos do rei” não são punidos, pois eles estão justamente sob a proteção do responsável pela repreensão ou punição, consolidando dentro do órgão a prática do dito popular: para os amigos tudo, para os inimigos os rigores das leis.
Enquanto os “amigos do rei” estão fazendo tudo para continuarem nas graças do rei e com isso se favorecerem com os benefícios pecuniários e de poder/status advindos da função comissionada, os servidores da casa acabam ficando somente com o ônus, conduzindo o trabalho como verdadeiros burros de carga, tornando-se o bode expiatório dos maus resultados obtidos pela chefia e sendo responsáveis pela produção do mínimo necessário que garanta a sobrevivência do órgão ao longo do tempo.
Assim ao mesmo tempo que os “amigos do rei” lambem para cima, cospem para baixo o fel de sua incompetência. Evidentemente que o seu poder instituído por meio da função comissionada, não lhe dá credenciais para ser visto como um chefe a ser respeitado, tendo em vista que o cargo de chefia requer a observância de papéis específicos e um comportamento adequado. Por isso ele não pode fazer o que quer simplesmente por ser “amigo do rei”, mas o que tem de ser feito em prol dos bons resultados para a organização.
Como o respeito é conquistado e não imposto por uma posição hierárquica, quando os chefes não demonstram nenhuma preocupação com a forma pela qual as equipes recebem e reagem às suas demandas, simplesmente porque pressupõem que o poder instituído pelo cargo é suficiente para que os subordinados lhe obedeçam e trabalhem a contento, eles estão fadados ao insucesso. Mas eles normalmente não admitem que esse insucesso é resultado de sua postura, mas sim tão somente da atuação de seus (in)subordinados.
Se porventura forem advertidos pelo rei que o desempenho de sua unidade está aquém do esperado, em vez de analisarem a situação e corrigirem as distorções, eles reativamente buscam moldar o comportamento dos subordinados aos seus pressupostos, imputando-lhes um rígido controle acompanhado de uma opressão para manter o seu poder, instalando o assédio moral no âmbito da unidade administrativa sob o seu comando.
Ao minar a auto-estima dos seus subordinados, os “amigos do rei” tiram a capacidade de questionar e de ser criativos e provoca neles um profundo sentimento de frustração. É sabido que um indivíduo oprimido pode até cumprir tarefas braçais ou burocráticas, mas não trará inovações necessárias à longevidade do órgão.
Quando os servidores ficam frustrados e não admiram os seus chefes, eles entram em linha de confrontação ou de negação passiva da autoridade tornando-se cada vez menos produtivo e comprometendo os resultados da unidade administrativa.
Esses fatores de corrosão tendem a aumentar com o passar do tempo, sendo o mais crítico deles a cegueira gerencial que provoca um enorme fosso entre os que mandam e os que devem obedecer, ainda mais se predominar um fluxo de informação verticalizada, em virtude da estrutura hierarquizada dos órgãos públicos, dificultando bastante a vazão, de forma livre e isenta, das idéias.
A boa hierarquia, aquela que ajuda o grupo a sobreviver e evoluir, deve buscar comportamentos eficazes, uma conduta madura, harmonização de interesses, a sinergia de esforços de cada um de seus colaboradores.
A influência exercida pela chefia sobre os seus subordinados e vice-versa deve ocorrer por meio de um eficiente processo de comunicação baseado em princípios éticos e morais, uma vez que o processo de comunicação desempenha um papel importante na administração, na percepção e na leitura do ambiente social, contribuindo para a análise dos planos de negócios da organização, identificando problemas e oportunidades.
Quando é estabelecida uma boa relação com o processo comunicativo, onde todos têm a oportunidade de transmitir suas idéias, há uma melhora nas relações interpessoais, gerando produtividade, resultados e sucesso nas ações cotidianas e, por conseguinte, desenvolvido um clima organizacional saudável efetivamente necessário para a organização.
Como no serviço público não há mais a ascensão funcional e há a concessão deturpada da função comissionada, a perspectiva de crescimento/satisfação profissional do servidor, por mais que ele se capacite e se esforce para apresentar melhor desempenho profissional, fica totalmente limitada ao seu bom-senso de dever para com o trabalho.
Sem contar com um o apoio efetivo do departamento do RH, que atua normalmente de forma capenga na elaboração e aplicação de diretrizes de pessoal, o servidor após anos de dedicação sem reconhecimento acaba num beco sem saída: resignando-se com a injustiça e/ou buscando um novo emprego que o remunere melhor ou que lhe reconheça como profissional.
Por isso, está cada vez mais freqüente o turnover de servidores no Poder Executivo, no Poder Legislativo e o no Poder Judiciário. Isso significa perda de bons profissionais e descontinuidade do processo de aprendizagem organizacional.
Os servidores que permanecem por muitos anos no órgão nessas condições de frustração, acabam se tornando pessoas amargas, desmotivadas e ou descrentes com toda a ação desassociada da sua vivência diária de trabalho promovida pelo órgão.
Por mais que se lancem programas mirabolantes que pregam isto e aquilo, dizem o que deve ser feito, que expressem o que querem e dão à impressão de saberem para onde conduzem os resultados, mas apenas se sustenta na fala e não nas ações do que pregam, os resultados são: colaboradores frustrados, pessoas que não compram e muito menos vendem as idéias que foram pregadas, descontentamento e críticas.
Enquanto não houver uma percepção clara de justiça e de possibilidade de valorização do seu trabalho, o servidor não se engajará no processo de mudança e tentará manter a todo custo o seu “status quo”.
A desmotivação do servidor impacta na sua saúde e no seu desempenho funcional, uma vez que ele não tem o motivo para ação, tornando-se lento ou ficando fora de combate com uma série de doenças originadas no ambiente de trabalho. Quanto maior o número de servidores desmotivados, maior a propensão de toda a organização adoecer e de sucumbir por inércia.
Muitos órgãos públicos atualmente se encontram na UTI e se não tomarem providências rápidas a esse respeito, há uma forte tendência deles sucumbirem. Inclusive a sua extinção será muito mais benéfica para população do que a sua continuidade pelo menos representará a economia do dinheiro público.
Para que os órgãos públicos mantenham-se legítimos perante a sociedade, seus parceiros, participantes e colaboradores, devem implantar ações estratégicas que lhe permitam cumprir o seu objetivo de ser ou de existir.
O primeiro passo nesse sentido é as autoridades se despirem de sua vaidade e abrirem mão da serventia de seus “amigos” em prol do cidadão que deve ocupar o centro das atenções dos esforços do órgão como um todo, bem como determinar que o RH elabore e implante diretrizes de pessoal a serem plenamente cumpridas por todos.
Como se pode pedir a outrem o que não se é capaz de fazer? Nossos gestos, atitudes e palavras fazem parte, permanentemente, de nossa existência e, por isso, têm o poder de projetar comportamentos, personalidade e caráter.
As pessoas ensinam fundamentalmente por meio do exemplo. Tendemos seguir os exemplos apresentados pelas pessoas nas suas ações do dia a dia e acatar os conselhos sobre os perigos a serem evitados e/ou receber críticas sobre os erros que estamos cometendo daquelas que temos admiração.
Assim sendo as autoridades devem ser os primeiros a dar o bom exemplo na adoção das diretrizes de pessoal, tendo em vista que nada é mais forte do que o exemplo, como diz o ditado “A palavra conduz, mas o exemplo arrasta”.
Nas diretrizes de pessoal, devem ser estipulados critérios objetivos de ocupação de funções comissionadas, destinando um percentual de 80 a 90% das funções comissionadas para os servidores de carreira que possuam o perfil e as competências necessárias para sua ocupação, bem como adoção de medidas para o desenvolvimento de um modelo de administração pública gerencial voltado para resultados, que possibilitem aprimorar projetos iniciados, completar os inacabados, corrigir as distorções e outras ações necessárias que devem ser realizadas sempre com respaldo nos princípios legais da moralidade, igualdade, eficiência, economicidade e razoabilidade.
Fazendo com que os princípios da concessão de função comissionada transcendam a teoria, tornando-se uma prática administrativa adotada por todos no âmbito dos órgãos públicos, certamente serão agregando valor na gestão pública cujo principal beneficiado será toda a sociedade.

Sob o Domínio do Cargo

Após anos de preparação profissional e dedicação ao trabalho, enfim chegou o grande dia do reconhecimento – a promoção para exercer um cargo de direção.

Orgulhosamente a pessoa passa a se apresentar envaidecida com o título nobiliárquico tal qual o pavão se apresenta com sua majestosa plumagem à sua pretendente.

A pessoa se empenha em desenvolver um trabalho de excelência e de muitos resultados para render-lhe elogios e admiração de todos, com o objetivo de construir uma imagem de sucesso para se sentir pessoa especial e aceita no sistema social.

Jornada de trabalho de 12 horas ou até mais, estresse elevado e falta de tempo para a família e para o próprio cuidado passam a ser normais no seu dia a dia.

Como forma de recompensar sua prolongada ausência, compra uma série de bens materiais para os seus familiares e para si mesma, tornando-se cada vez mais constate o presente no lugar do afago. A casa fica cheia de objetos caros e de última geração, mas o coração fica vazio de amor pela falta de convivência com os seus entes queridos.

O que deveria ser uma recompensa passa a ser uma fonte de angústia. A necessidade criada de manter o padrão de vida elevado da sua família como contrapartida de sua ausência faz com que a pessoa não consiga mais se desvincular do contracheque recheado de dindim acompanhado das pompas do papel de gente importante exercido.

Não obstante não existir nenhuma grade, a pessoa torna-se prisioneiro materialista. Ela acredita que o seu valor para a sociedade esteja naquilo que faz e pelo que tem e não pelo o que ela é.

Quando a pessoa pensa em si mesma como algo separado do outro, cria uma espécie de ilusão de ótica da consciência, projetando os desejos pessoais, conceitos e afetos nas expectativas das pessoas mais próximas, gerando cisão com o seu eu interno, pois no final das contas a pessoa não consegue satisfazer os outros e muito menos a ela mesma, pois no fundo, o que ela queria mesmo era ser amada e aceita pelos outros como ela é.

O trabalho converte a pessoa numa ilha cercada de medos e de conflitos internos. Faltando-lhe coragem, vontade, motivo e força para enfrentar o medo da perda material e da perda de admiração dos outros, ela se recusa a mudar essa situação.

O seu ser fica paralisado e as ações centradas em manter o status quo, armando-se até os dentes para defender aquilo que julga possuir. Torna-se uma pessoa frustrada por ver que ser quem se “gostaria” de ser não é exatamente quem se é.

Para amenizar sua dor e confortar o seu ego, a pessoa diz que o sacrifício pessoal é em virtude da família. Essa justificativa é suficiente para que a pessoa permaneça num lugar contra a sua vontade e emita uma imagem de um ser superior, apesar de se sentir como um verme interiormente, deixando a vida se esvaziar entre os dedos para manter-se numa segurança de uma vida forjada sobre o falso sucesso nutrido pelo ego.

A transferência da responsabilidade da escolha do caminho de vida para a família tira-lhe das mãos as oportunidades que tem de transformar-se num ser melhor, uma vez que ela não sabe o que fazer, não sabe o que quer ser e não dá o mínimo valor ao que já é.

Posicionando-se como mera espectadora, assistindo a tudo de “camarote”, deixando que tudo aconteça diante aos olhos sem sequer mover-se para mudar, a pessoa deixa a vida percorrer caminhos tortuosos que levem ao caos interno e a falta de sentido de vida, bem como carrega fardos enormes de desesperança no seu ser.

A vida é feita de escolhas. O dia a dia exige a tomada de uma série de decisões, desde a mais simples: como que roupa usar até a mais complexa de ser em detrimento de ter. E cada um é responsável pelas suas conseqüências boas ou ruins, principalmente se não agir e transferir a responsabilidade de viver a sua vida a outrem.

Na sociedade capitalista, todos nós vivemos um terrível dilema diário entre o ter e o ser. Qual irá predominar, dependerá do tipo de pensamento que nós tivermos acerca de nós mesmos e das ações dele advindas.

É preciso coragem de olhar para dentro e reconhecer-se plenamente sob o olhar da sinceridade sem estar preocupado com o que os outros pensam ao seu respeito.

Trata-se de tarefa Hercúlea livrar-se da ilusão do ego, ampliar o horizonte de compreensão da vida, para que ele abranja toda a natureza humana em sua essência e beleza. Apesar de ser quase impossível conseguir alcançar o objetivo, o tentar já é por si só parte da libertação e a primeira pedra na construção do alicerce da paz de espírito.

Cada um vive a vida que julga melhor pra si, fazendo a escolha do caminho a ser percorrido rumo à concretização dos sonhos e da felicidade. Por isso não se deve aceitar as coisas como simplesmente são, não se deve calar a voz do coração, não se deve parar quando há caminho a seguir, e principalmente não se deve desistir de se amar e nutrir a alma. É preciso viver a vida para se sentir vivo.

Como diz o provérbio grego, é preferível ser dono de uma moeda do que escravo de duas.