sexta-feira, 20 de abril de 2012

Um Estranho no Serviço Público


Ao longo dos anos, criou-se na cultura do serviço público uma relação insensível e perversa aos princípios administrativos e à coisa pública, onde a maioria dos pretendentes ao cargo público acredita que basta passar no concurso público para obter água e sombra fresca pelo resto da vida.

Essa ideia vem de anos de desconstrução do conceito de ser servidor público por meio de práticas de agentes que misturam as esferas públicas e privadas e fazem dos cofres públicos os seus bolsos e da infra-estrutura organizacional a sua cozinha para promoverem verdadeiros banquetes para os seus convidados à custa dos impostos pagos pela população brasileira.

Cada pessoa pensa em somente tirar o máximo de proveito de ser servidor público, onde, garantindo-se na estabilidade, não se preocupa com os resultados, pois não há nenhuma cobrança e/ou punição para o servidor que trabalha mal e faz corpo mole.

A ausência de senso de responsabilidade ou de vontade de trabalhar para o bem da sociedade, conciliado com a falta de punição dos atos administrativos, faz com que os servidores adotem uma postura egoísta que prolifera com muita facilidade e rapidez no ambiente de trabalho. Assim sendo, mesmo que alguns desses novos servidores tenham outra perspectiva e/ou idealismo de fazer a diferença para o serviço público, com o tempo, acabam seguindo um padrão de procedimento laboral que não vai além da lição de casa.

Os conluios são praxes comuns e os mecanismos de combate aos que se colocam contra a essas práticas são criados e reforçados para brecar a todo custo quem desafia o status quo, provocando uma divisão de margens: num lado estão os “aproveitadores” e do outro lado os “sobreviventes”, restando somente uma borda para os “inconformados”.

Esses atos baseados na politicagem acarretam a valorização de comportamentos que depõem contra a boa gestão administrativa, uma vez que qualquer atitude fora do padrão comportamental: de fingir que está tudo bem, de não fazer alarde diante das falcatruas, de não discutir o problema do mau emprego do dinheiro público, de não reclamar dos mandos e desmandos de chefes incompetentes, de ver a roupa de um rei nu – provocará conflito no ambiente de trabalho e realçará a sujeira colocada por debaixo do tapete.

Em vez de se valorizar a pluralidade, a diversidade e a contribuição que cada ser único pode dar, é feita a construção de uma vala comum para todos por meio de mecanismos sociais para eliminar membros indesejáveis e para estimular os outros a manterem seu comportamento de ovelhinha. Quando alguém simplesmente não aceita esta imposição e tem a coragem de levantar uma bandeira e lutar pela coisa pública, ela, no mínimo, é tida por ovelha negra, dentro outros predicados, causando profunda estranheza às ovelhas do rebanho, que passa a tratá-la como louca.

Num local onde a maioria das pessoas é mero fantoche e está seguindo o seu próprio manual da sobrevivência, ter pensamentos autênticos é perigoso, ser o único a ver a nudez do rei, é insano e o pior de tudo, ser competente é condenar-se à solitária, pois a verdade intimida e a apresentação de resultados palpáveis chega a ser espantosa num local onde as pessoas fazem de conta que estão trabalhando. Este servidor se torna um verdadeiro estranho no serviço público.






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