sábado, 1 de dezembro de 2012

A Era da Besta


A Besta instaura o seu trono a partir de sua designação para ocupar cargo comissionado do alto escalão no serviço público. Com o discurso de que irá trazer prosperidade organizacional, angaria a simpatia de seu nomeador e adquire a carta branca para seus atos alucinantes e enfermos.

Do seu alto posto, empertigado na sua poltrona com o orgulho de um Rei, ao qual ascendeu sem qualquer mérito, mas tão somente por causa de suas relações pessoais e cujo passado não se tem notícias, arquiteta leis próprias e utiliza formas obscuras de agir. Perante as autoridades superiores e do mesmo nível hierárquico a Besta age sob a pele de cordeiro, seduzindo-os com seus simulados sorrisos e presteza no atendimento servil de suas solicitações, enquanto com os subordinados ela fala como dragão e destila todo o seu veneno impondo suas vontades ardis aos berros de quem quer se fazer notar pelo escândalo. Com isso faz com que os seus pares o adorem enquanto os seus subordinados o temam.

Reina nesse tipo de gestão o estilo eu faço do jeito que me aprouver chancelado pelo dirigente máximo da organização e vocês são obrigados a me engolir, destruindo o respeito que deve existir entre chefia e subordinado e acarretando assim o estado de escravidão a partir da opressão e da privação de um ambiente profissional saudável e a instauração de tempos hipócritas, onde prevalecem os caprichos pessoais sobre as boas práticas administrativas.

À base da chicotada, a Besta coloca todos os seus subordinados em estado de frenesi interminável. É um tal de botar o pessoal para se virar nos trinta, num corre-corre danado, até que todos façam não o que é necessário para o bom andamento dos serviços mas o que agrade e massageie o ego inflado da Besta.

Utiliza da crítica, impregnada de maledicência, para minar o ser humano e para confundir a cabeça e denegrir impiedosamente a imagem que o servidor tem de si mesmo enquanto profissional. Da boca da Besta saem palavras cheias de blasfêmia e destruidoras da alma, enquanto em sua assinatura se encontra o selo do destino apocalíptico do servidor.

O produto de suas ações, originado no seu abominável caráter e na imundícia da sua prostituição profissional, conduz o subordinado a uma situação dolorosa e humilhante, bem como dissemina a iniquidade administrativa. Cada um em seu canto, se virando com o seu manual de sobrevivência, significa o estímulo para apostasia de convicções profissionais e para a procura de refúgio na mediocridade.

A Besta não mede esforços para atingir os objetivos inescrupulosos de ser dono do pedaço, bem como de condutas que contrariam as boas práticas administrativas para sucatear a máquina administrativa em prol do seu próprio ego. Com o tempo exaltará a si mesmo como sendo o "Salvador do Serviço Público" que elimina a praga do servidor público e com isso exigirá ser adorado como o Profissional do Ano, declarando-se então ser o hors concours.

Quando as ações da Besta contra os servidores não são repudiadas pelo Departamento de Pessoal, muito pelo contrário, há uma conivência quando se observa tão somente os aspectos burocráticos dos procedimentos de colocação do servidor à sua disposição, desprezando o aspecto emocional e humano envolvido na ação de perseguição, abrem-se espaços para que os maus tratos aumentem, bem como há a nutrição do poder e do orgulho da Besta, expandindo e perpetuando o seu reino da maldade.

À medida que seu poder aumenta em virtude da perseguição implacável de todos os subordinados que não se curvarem aos seus caprichos e/ou fingirem que a adoram, a unidade administrativa que a Besta conduz torna-se um lugar mais sombrio, com perigos invisíveis sobre o desenvolvimento do trabalho – perigos que poucos estão conscientes, pois eles atuam tal qual o câncer silenciosamente na mente individual e coletiva profissional. Assim sendo, o poder inerente ao cargo comissionado assume todos os caracteres de um estado mórbido por meio da utilização da arte do desprezo, onde impor suas vontades torna-se uma obsessão e uma forma de submeter os que considera inferiores aos seus mandos e desmandos para deles fazer seus fantoches no tabuleiro do jogo de poder, onde predomina a traição e a trapaça.

É fácil identificar a Besta e desmistificar o discurso propalado de um oportunista e aproveitador que não tem a ética como um valor inerente ao seu perfil profissional. A Besta nada se parece com o monstro tal qual é retratado nas produções cinematográficas, entretanto suas atitudes, cheias de artimanhas do demônio, quando são manifestadas, mudam o mundo profissional daqueles que se constituíram em alvos e foram subjulgados despoticamente, sem qualquer direito à defesa, tão somente por puro capricho sádico.

A Besta, que faz questão de demonstrar a sua força e massacrar àqueles que se apresentam como obstáculo no seu caminho, esquece-se que tudo é fugaz neste mundo. Na verdade a Besta não é por si só todo-poderoso originalmente, mas sim investida de poder por causa da ocupação do cargo comissionado, que não lhe concede o direito de fazer tudo que lhe aprouver, de ferir sentimentos para satisfazer o seu lado negro da vaidade sem que com isso, num futuro próximo, tenha que prestar satisfação de seus atos quando for submetido ao juízo final, onde reinará a justiça, não dos homens, mas a de Deus.

No final da gestão da Besta, obtêm-se saldos negativos, onde se acumulam fracassos e mais fracassos organizacionais, pois àquilo que o servidor suportou e sofreu de assédio moral estará na sua lembrança do tempo em que viveu num ambiente de trabalho mergulhado nas trevas, e por muito tempo ou talvez nunca será apagado o sofrimento de seus corações ao qual foram submetidos por quem deveria conduzi-lo para a satisfação profissional, evitando que consiga acreditar nos moventes sinais de um amanhã sob uma nova gestão e de trabalhar com o mesmo comprometimento de tempos anteriores ao ataque da Besta.

E foi com a presença de Bestas nos cargos de chefia que, durante o decorrer da história, muitos órgãos públicos acabaram sendo extintos. Porque o orgulho exacerbado dos dirigentes apenas leva a derrocada, até porque do ocupante do cargo comissionado se espera o respeito, não a opressão dos subordinados. Espera-se a humildade dos sábios, não a insensibilidade dos indiferentes ou o orgasmo dos sádicos em prol de seu próprio ego de Pavão.

O grande chefe é aquele que se utiliza da simplicidade e da sabedoria para conduzir os seus subordinados ao sucesso pessoal e profissional por meio de exemplos, onde em cada ato há a presença de um espírito nobre e sensível aos aspectos humanos, extraindo de cada servidor o que se tem de melhor em prol da organização. 

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

A Peste no Serviço Público


De tempos em tempos no órgão público a mudança da gestão administrativa vem acompanhada de pandemia da má gestão da coisa pública. Os surtos da peste têm origem no estilo gerencial dos “paraquedistas políticos” que, absortos nos seus próprios interesses pessoais de poder, ganância e de autopromoção junto ao dirigente máximo, assolam as unidades administrativas para as quais são designados. Dependendo da sede de poder e da vaidade do novo ocupante do cargo comissionado, suas ações podem fazer com que a doença se instale rápido ou mais devagar.

As principais características da doença institucional são: desmotivação, queda de produtividade, injustiça, assédio moral, puxada de tapete, clima de insegurança, caça às bruxas, onde em vez de se resolver problema busca-se culpado; entre outros que minam a autoestima dos servidores da casa e os fazem sentir como se fossem a escória do serviço público tamanho o desrespeito com que são tratados.

A epidemia se apresenta de duas maneiras.  No primeiro mês as ações contra os servidores concursados se limitam aos “paraquedistas políticos”, mas logo após tornam-se também praxes comuns entre colegas de trabalho que, despindo-se da sua ética profissional, coloca de lado os princípios da boa convivência e incorpora o papel de delator da versão que lhe convém circunstancialmente para se sobressair sobre o outro independente dos estragos que suas mentiras - fruto de sua ótica distorcida do colega, possam provocar. Esse tipo de comportamento covarde permite à peste da má gestão estabelecer-se porque, com cada um agindo por si, há sempre suficiente número de novos hóspedes de forma contínua para a sua manutenção endêmica.

É só uma questão de tempo até que a epidemia da peste gerencial se espalhe por toda a organização, provocando o desaparecimento do espírito coletivo e da solidariedade. O contágio da doença desenvolve-se no dia a dia organizacional por meio de atitudes desrespeitosas no trato entre chefe e subordinado e entre colegas, chegando ao seu ápice quando, percebendo que poderá queimar o seu “filme” a proximidade com os que foram perseguidos como se fossem criminosos, os outros servidores isolam os colocados à disposição do Departamento de Recursos Humanos, condenando-os ao isolamento, deixando-os abandonado à sua própria sorte profissional.

As reações ao surto são variadas, como é natural que ocorra em qualquer evento: cada qual tem um jeito peculiar de entender e absorver os efeitos da epidemia. É a natureza humana reagir e responder a diferentes eventos e circunstâncias dependendo do grau em que o sofra. Para alguns, trata-se de mais uma gestão que perdura durante um tempo e depois, assim como chegou, parte voltando ao normal o seu dia a dia, bastando fingir-se de morto durante este tempo. Para outros, que sofreram o assédio moral e tiveram o seu orgulho profissional ceifado, trata-se de uma questão de vida e morte, onde para sobreviver tem necessidade de se colocar em uma verdadeira redoma na qual possa se proteger de investidas dos “paraquedistas políticos” e dos próprios colegas de trabalho. Assim sendo, eles se veem obrigados a viver no ostracismo profissional e levar uma vida de sobrevivente do holocausto. Carpe diem, esta se torna a sua norma e a sua conduta enquanto perdura a má gestão.

A mudança comportamental, onde é extraído o que cada servidor tem de pior em seu caráter, provoca modos de busca pela salvação, que se torna para muitos quase uma obsessão subjugar o outro e maltratá-lo psicologicamente com doses generosas de crueldade.

A má gestão cria um clima de pessimismo e de medo. As condições pesadas do clima organizacional originadas pelo desrespeito da pessoa humana antes de tudo afetam a psique do servidor, atacando sua autoestima e criando um estado de desconforto emocional que impacta no seu dia a dia pessoal e profissional, levando-o ao estado de depressão e a outros tipos de doenças psicológicas e física que fazem com que ele entre cada vez mais com atestados médicos e não consiga produzir. Trabalhar se torna uma verdadeira tortura emocional para os servidores infectados diretamente pelo seu chefe.

Percebe-se, assim, como o surto faz com que a doença infecte o corpo funcional e provoque mudanças na forma de ser e agir dos servidores e na sua capacidade produtiva.

A peste no final de seu estágio de contágio atinge indiscriminadamente todos os servidores refletindo os seus efeitos maléficos para a baixa da qualidade dos serviços prestados a sociedade. Assim sendo, a peste da má gestão vai além da organização e cobra também um preço alto da sociedade que continua pagando seus impostos sem que para isso tenha em contrapartida serviços públicos de qualidade. Infelizmente a culpa só é imputada para o servidor carreirista. Desconhecendo as origens da peste, muitos cidadãos culpam os servidores concursados os horrores causados pelo mau-funcionamento da máquina administrativa, não entendendo que eles são somente mais uma vítima das atrocidades da má gestão gerencial.

O pior de tudo é que a peste é promovida pelo dirigente máximo da organização, fazendo com que os servidores que não se coadunaram com a peste trabalhem e paguem todos os ônus provocados pelos atos inconsequentes de seus protegidos colocados em postos chaves, os quais deveriam ser responsáveis pela condução do trabalho rumo à modernização. Entretanto o que os indicados políticos promovem é tão somente a destruição das boas práticas administrativas e depois vão embora sem olhar para trás a devastação que deixaram, assim como fazem os gafanhotos na plantação. E, apesar da destruição provocada pela peste, os políticos dirigentes continuam fornecendo todas as condições de que ela regresse junto com a sua gestão, nomeando pessoas altamente incompetentes que contaminam toda a organização, assim como ocorre com uma fruta podre dentro do cesto.

Se compararmos com os efeitos das pestes de gestões anteriores, é possível verificarmos que elas são quase idênticas à versão moderna. Mesmo quando o pior passa epidemias menores continuam a acontecer, transportando os sintomas para a nova gestão após a mudança. Os sobreviventes da peste e alguns moribundos vivem em medo constante do retorno da peste, e a doença não desaparece até que seja combatida com o advento da meritocracia e do respeito para com a pessoa humana e, por conseguinte, para com o profissional que por méritos próprios ingressou no serviço público. 

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Um Estranho no Serviço Público


Ao longo dos anos, criou-se na cultura do serviço público uma relação insensível e perversa aos princípios administrativos e à coisa pública, onde a maioria dos pretendentes ao cargo público acredita que basta passar no concurso público para obter água e sombra fresca pelo resto da vida.

Essa ideia vem de anos de desconstrução do conceito de ser servidor público por meio de práticas de agentes que misturam as esferas públicas e privadas e fazem dos cofres públicos os seus bolsos e da infra-estrutura organizacional a sua cozinha para promoverem verdadeiros banquetes para os seus convidados à custa dos impostos pagos pela população brasileira.

Cada pessoa pensa em somente tirar o máximo de proveito de ser servidor público, onde, garantindo-se na estabilidade, não se preocupa com os resultados, pois não há nenhuma cobrança e/ou punição para o servidor que trabalha mal e faz corpo mole.

A ausência de senso de responsabilidade ou de vontade de trabalhar para o bem da sociedade, conciliado com a falta de punição dos atos administrativos, faz com que os servidores adotem uma postura egoísta que prolifera com muita facilidade e rapidez no ambiente de trabalho. Assim sendo, mesmo que alguns desses novos servidores tenham outra perspectiva e/ou idealismo de fazer a diferença para o serviço público, com o tempo, acabam seguindo um padrão de procedimento laboral que não vai além da lição de casa.

Os conluios são praxes comuns e os mecanismos de combate aos que se colocam contra a essas práticas são criados e reforçados para brecar a todo custo quem desafia o status quo, provocando uma divisão de margens: num lado estão os “aproveitadores” e do outro lado os “sobreviventes”, restando somente uma borda para os “inconformados”.

Esses atos baseados na politicagem acarretam a valorização de comportamentos que depõem contra a boa gestão administrativa, uma vez que qualquer atitude fora do padrão comportamental: de fingir que está tudo bem, de não fazer alarde diante das falcatruas, de não discutir o problema do mau emprego do dinheiro público, de não reclamar dos mandos e desmandos de chefes incompetentes, de ver a roupa de um rei nu – provocará conflito no ambiente de trabalho e realçará a sujeira colocada por debaixo do tapete.

Em vez de se valorizar a pluralidade, a diversidade e a contribuição que cada ser único pode dar, é feita a construção de uma vala comum para todos por meio de mecanismos sociais para eliminar membros indesejáveis e para estimular os outros a manterem seu comportamento de ovelhinha. Quando alguém simplesmente não aceita esta imposição e tem a coragem de levantar uma bandeira e lutar pela coisa pública, ela, no mínimo, é tida por ovelha negra, dentro outros predicados, causando profunda estranheza às ovelhas do rebanho, que passa a tratá-la como louca.

Num local onde a maioria das pessoas é mero fantoche e está seguindo o seu próprio manual da sobrevivência, ter pensamentos autênticos é perigoso, ser o único a ver a nudez do rei, é insano e o pior de tudo, ser competente é condenar-se à solitária, pois a verdade intimida e a apresentação de resultados palpáveis chega a ser espantosa num local onde as pessoas fazem de conta que estão trabalhando. Este servidor se torna um verdadeiro estranho no serviço público.